"Eu vi o tempo brincando ao redor do caminho daquele menino"...

sexta-feira, 22 de maio de 2020

Pra quem gosta de música...


“Se o artista conhece o folclore da cultura dele,
toca as músicas com paixão.”
(Wynton Marsalis)

E, apesar dessa citação ser de um músico estrangeiro, posso afirmar que não preciso tanto daquelas músicas que vêm de fora, as da minha terra já me satisfazem, as do meu país Nordeste, então? Essas talvez sejam as melhores músicas de todas. A música feita no meu país, no meu terreiro, já me envolve por completo e cada vez que eu me aprofundo mais nela, eu fico ainda mais fascinado. A música me salva, ela é a minha religião.
Sempre viajei em letras, em histórias contadas, em palavras bem escritas, era isso que me fascinava desde cedo, que me digam aquele cara que “usava óculos escuros e previa que a Terra iria parar” ou aquele outro que falava do “tal João de Santo Cristo” ou ainda aquele que exaltava a “festa da música tupiniquim”.
Durante muitos anos eles estão comigo, parece até que alguns já são amigos íntimos. E tudo começou ainda na infância, quando me trancava a tarde toda num quarto e lá estavam tantos e tantos discos que me fizeram formar essa base musical sólida.
“O dia em que a Terra parou”, “Que país é este?”, “Por onde andará Stephen Fry?”, “Quebra-cabeça”, “Da lama ao caos”, “O Grande Encontro”, “Acervo Especial Engenheiros do Hawaii”, “Cássia Eller Acústico”, “Titãs Acústico”, “Djavan Ao Vivo” são exemplos de discos que hoje eu sei que fazem parte da nossa rica música brasileira e me orgulho de já ouvi-los desde pequeno. São os meus velhos heróis de guerra, mas uma guerra sempre boa, uma guerra sempre do bem.
Tudo meu, ainda hoje, é muito musical. Eu escuto música, eu faço música, eu vivo música. Eu crio pensando música, eu escrevo pensando música, eu faço associações pensando música. E ultimamente isso está cada vez mais aflorado.
Lá estão eles, como sempre presos na parede, mas também presos nos meus ouvidos e até mesmo no meu coração. Na parede eu os exponho como uma forma de beleza, nos ouvidos embelezam através das ondas sonoras que invadem e chegam ao meu coração. Com o tempo tentei fazer do meu próprio jeito, mas nunca fui tão bom nisso, sempre fui apenas um eterno admirador e viciado por essa arte, nunca um grande executor dela.
Só depois de muito tempo que comecei a perceber além das histórias e passei a me encantar também por arranjos, por preenchimentos, por sons que sempre estiveram ali e eu nunca percebia. Essa nova "visão" da música veio, claro, por causa da paixão que surgiu pela percussão. AH, A PERCUSSÃO! Foram esses mais barulhentos que fizeram eu entender melhor como funciona todo o processo de criação, pois os graúdos de cordas sem àqueles miúdos não são muita coisa. 

“Antes dos mouros o som
O som de tudo que passou por lá
O som de tudo que passou aqui
O som que vem quem viver verá”
(Antes dos Mouros – Cordel do Fogo Encantado)

É através do estudo da percussão que a gente faz uma regressão e vê que tudo começou com o toque do tambor. AH, O TAMBOR! O pop, o rock, o blues, o funk, o rap, o forró, todos são filhos da batida do tambor. E foi através dele que eu voltei aos nossos ancestrais, às nossas origens.
A gente começa ouvindo as músicas pop, as bandas de rock e vai começando a gostar disso tudo. Depois vai amadurecendo e percorrendo os grandes nomes da MPB e vai tendo noção do processo. Mas é só quando você volta aos cantos e toques dos povos primitivos que você realmente entende tudo e descobre que a magia toda começa lá.
Aí eu retorno para a citação lá de cima, só quando me aproprio do meu folclore que passo a me sentir mais pertencente às culturas primitivas que me formaram, através disso que toco as músicas com muito mais paixão.
Quem me vê tocando um tambor sabe do que eu estou falando. Eu realmente saio desse plano físico, eu transcendo e com certeza consigo fazer uma ligação entre o couro do tambor e alguma coisa além disso tudo aqui. É tudo muito lindo, encantador, emocionante.
Provavelmente eu entro em sintonia com Deus quando estou a apreciar o som de todos os instrumentos juntos, viajando em letras e em histórias contadas e cantadas. E se me perguntam se eu realmente creio em Deus? Não sei, mas talvez Ele esteja em pleno desfile de carnaval, em um sábado de chuva, pulsando através do couro de um tambor que reverbera bem no meio do coração de um batuqueiro. Afinal, Ele está onde a gente quiser...

Desfile de Carnaval do Maracatu Solar (Sábado – 22/02/2020)
Foto de Aurélio Alves (Instagram: @_aurelioalves). Jornal O Povo.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Fortaleza do Maracatu


Ilustração de Luana Florentino (Instagram: @luanaflorentinoc)

Chegaram todos à Pindorama,
Terra rica de tantos seres.
Juntaram-se com novos povos
Num amálgama de saberes.

No princípio foram cativos,
Mas não esqueceram seus antepassados.
Por isso seguiram vivos,
Revivendo o seu passado.

Do adro do Rosário nasceu a beleza.
Do toque dos tambores fez vibrar a natureza.
Do rei e da rainha a nossa realeza.
Do canto dos cantores veio a fortaleza.

Fortaleza do maracatu,
Eu sempre vou voltar pra tu.

Oh, Az de Ouro,
Eu vou voltar pra tu.
Ancestral e transcendental,
Esse é meu maracatu.

Com a Boca Aberta
E o coração também,
Eu vou te revivendo
Nesse batuque que me convém.

Sim, o maracatu venceu!
Deixou o preconceito de lado,
No tempo e no espaço
Ele se fortaleceu.

Hoje eu canto suas histórias,
Hoje eu resgato meus antepassados,
Hoje eu invento novas memórias,
Mas nunca esquecendo do meu passado.

(Janderson Oliveira)

sexta-feira, 8 de maio de 2020

Reflexões sobre o antes, o agora e o depois...


Retiro o que eu disse. Não, não é verdade, eu até já me desanimei. Pensava que voltaríamos melhores depois disso tudo, mas talvez voltemos é piores. Desde criança sabemos que existe uma lista de animais em extinção, talvez os próximos seremos nós mesmos. E a culpa da nossa extinção será nossa, acredita?
São tantos exemplos de desumanidade nesses tempos de pandemia, começando pelo canalha do nosso presidente, que nos faz ter a certeza de que as coisas não irão melhorar. É só olhar para trás, quantas pandemias já tivemos? A última faz pouco mais de um século, mas a história só mostra o estado onde nós chegamos depois dela. Ninguém melhorou por ter sofrido em pandemias, pelo contrário, só o que tem é gente lucrando com isso. Somos seres consumidos pelo egoísmo e consumidores do capitalismo, não temos mais para onde fugir.
Mas olhando novamente para o retrovisor da história, se pensarmos em experiências “comunistas” pelo mundo, veremos que elas não deram muito certo também. Seja a URSS de Stalin, a China de Mao Tsé, a Cuba de Fidel, a Venezuela de Chávez, a Coreia do Norte de Kim Jong-un ou até mesmo o Brasil de Lula, quase todas foram experiências extremistas, tirando o Brasil, os seus governantes viraram ditadores. O conceito, a teoria, a ideologia pregados pelo comunismo/socialismo/marxismo/leninismo era uma coisa e os caras distorceram tudo na prática.
A única certeza em meio a isso tudo é que esse governo atual do Brasil é o pior que eu já vivi nos meus pouco mais de 30 anos. Um presidente totalmente despreparado e sem noção, o pior é que todo mundo já sabia disso e mesmo assim ele chegou onde queria. Pior ainda é ter tanta gente que segue apoiando as loucuras dele, caminhando lado a lado com o extremismo de direita, beirando ao fascismo. Eu usei muitas vezes a palavra "pior" nesse parágrafo, então é porque a coisa tá ruim mesmo.
No final é tudo política e o povo que se exploda. Chego ao consenso que direita e esquerda não nos levam a lugar nenhum. Putz, o centrão chega a ser ainda pior! (Risos). Já diria Djonga: “esquerda de lá, direita de cá e o povo segue firme tomando no centro”.
O problema todo é social e econômico, uns têm demais e outros têm de menos. Não temos saúde, segurança e educação de qualidade para todos, apenas para aqueles que conseguem pagar. No entanto, é difícil ter uma solução para resolver isso agora, o máximo que podemos ter são paliativos para fingir soluções. O problema todo está é lá no início da história, onde tudo já começou desigual, umas famílias ricas demais e outras sendo escravizadas. Não tinha como isso dar certo no final e talvez esse final seja agora, nesses tempos em que estamos vivendo.
Ou talvez possamos reaprender com as sociedades primitivas e tentar nos dar uma sobrevida diante de tantos males. Há muito tempo esses povos sabem que a mãe Terra clama por socorro, eles sabem que ela reclama dessa nossa exploração desenfreada pela matéria prima. Tanto que a coisa mais essencial hoje em dia não é nem mais a política e nem a economia, mas o meio ambiente. Deveríamos parar e ouvir o que essas sociedades primitivas têm para nos dizer, os nossos índios já habitavam isso aqui bem antes de todos nós, precisamos sentar e assistir às suas aulas. Falando nisso, vale a pena essa aula do líder indígena Ailton Krenak: “fomos, durante muito tempo, embalados com a história de que somos a humanidade e nos alienamos desse organismo de que somos parte, a Terra, passando a pensar que ele é uma coisa e nós, outra: a Terra e a humanidade. Eu não percebo que exista algo que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza”.
A história da humanidade é feita de ciclos e renovações, desde a Antiguidade, passando pelo período da Idade Média, depois as Grandes Navegações, o Renascimento e a Revolução Industrial até chegarmos aos tempos atuais onde reinam o capitalismo e a globalização. Estamos na história, fazendo parte dela e as coisas que vemos não são das melhores. Apesar desse tempo ser riquíssimo em termos de ciência e tecnologia, ainda assim estamos passando pelas piores crises sanitária, econômica e ambiental. Um dia esse ciclo se acaba, renovações surgem e talvez até a nossa espécie melhore, mas é uma pena que não estaremos mais aqui para ver.
Esquece tudo o que eu disse, eu sou bem contraditório mesmo. De noite eu sou bem inventivo, de dia eu já não gosto de quase nada do que eu inventei.