Ainda bem que eu nasci no Nordeste. Este fato me leva ao entendimento que meus ídolos são outros, eles não estão no mainstream, mas ainda assim estão no ápice do que há de melhor na nossa cultura.
Os meus ídolos agora são outros, eles estão espalhados pelas ruas do Bairro do Benfica, nas ladeiras do Bairro João Cabral e de Olinda. Eles estão no Alto do Cruzeiro, na Comunidade dos Souza e na Cachoeira da Onça. Estão ainda na Praia de Almofala, na cidade do Crato e nas históricas Igarassu e Ilha de Itamaracá.
Os meus ídolos são um mestre que vive o reisado na Bela Vista, os palhaços Mateu de Juazeiro, os irmãos que cantam e encantam em seu terreiro, uma mestra que se fez mestra tão cedo e um mestre que anda com seu bacamarte só pregando a paz.
Os meus ídolos são toda uma família que samba coco em Arcoverde, uma preta velha que balança o ganzá em Custódia, uns caboclos que balançam suas plumas e jogam suas lanças em Araçoiaba.
Os meus ídolos são um gênio que balança maraca em Ibicuitaba, uma líder quilombola que bate pandeiro e canta coco no Sítio Vassourinhas, um jovem mestre de batuque com a voz rouca, um pai de santo com um sorriso contagiante, um mestre que veio de outras terras para formar caravana por aqui em Fortaleza.
Os meus ídolos são um rabequeiro que faz sua rabeca falar pelo Nordeste, uma macumbeira de São Luís do Maranhão, um mestre que mata e ressuscita o seu boi na Barra do Ceará, uma sertaneja que canta forró pelo interior afora.
Os meus ídolos são um encantado que foi cantar lá no céu, uma rainha cirandeira da beira da praia, uma senhora frágil que ainda canta coco com toda sua força, um mestre que entoa o baque forte do maracatu e um parceiro imponente que há anos toca sua alfaia aqui ao meu lado.
Os meus ídolos são pais que cantam, filhos que dançam e netos que dormem no colo dançante de suas mães. Os meus ídolos calçam tamancos, pintam a cara de negro, usam saias rodadas, carregam suas espadas, batem seus tambores.
Eles não precisam de holofotes, fazem a festa e perpetuam a cultura ali mesmo, no seu cantinho, no seu espaço. Os meus ídolos são gente comum que não faz arte por dinheiro, mas que brinca com alegria e festeja na sua comunidade...