"Eu vi o tempo brincando ao redor do caminho daquele menino"...

quarta-feira, 27 de maio de 2009

"O corpo fala"...

"O corpo fala", há pouco tempo fui descobrir que essa expressão realmente é válida, literalmente o corpo fala, quer dizer, literalmente não, corporalmente. Essa expressão é muito falada no meio dos profissionais de Educação Física e Psicologia, mas eu sempre ficava com um pé atrás em relação a essa história do corpo falar. Cheguei até a ler um livro que tem como título essa mesma expressão, pensava que iria ser uma leitura interessantíssima, mas não me agradou muito.
Faz cerca de 2 meses e meio que comecei um curso de Libras (Língua Brasileira de Sinais) e comecei a perceber a partir disso o quanto o nosso corpo se comunica sim. Por si só o aprendizado de Libras já é uma coisa fascinante, toda uma língua escondida nos nossos movimentos, no nosso corpo. Mas o mais impressionante é que agora fico percebendo as pessoas conversando (em português mesmo, não em Libras) e o quanto elas utilizam o corpo juntamente com a fala. Sempre fico olhando um círculo de amigos, uma dupla, o professor durante a aula e eles estão sempre demonstrado aquilo que estão falando através de gestos, é como se eles desenhassem o que falam, o ar é seu quadro e os dedos, as mãos e, às vezes todo o corpo, são os seus pincéis. É, realmente para falar, nós também utilizamos o corpo e o corpo por si só também fala, demonstra nossa personalidade, nosso estado de ânimo, nossas tensões.
Voltando à Libras, essa é uma língua interessantíssima, cheia de simbolismo, de representações das coisas, tudo está relacionado com o concreto, com o que as coisas realmente são, entendem? As configurações (gestos feitos com a mãos) ou sinais das Libras estão sempre ligadas ao real, sempre lembram a palavra que queremos dizer. Achava que seria difícil aprender essa nova língua, mas nas aulas eu estou sempre querendo saber mais e mais, realmente é algo fascinante. Tudo que queremos falar está expresso ali, no nosso corpo...

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Música boa...

Para mim, música boa é aquela que tem conteúdo, não me interessa muito a forma. É a letra da música que expressa o verdadeiro sentido dela, o ritmo em que ela é tocada é o de menos. Não importa se é funk ou forró, samba ou rock, o que interessa é o significado que sua letra quer passar, por isso que a letra deve ser boa. Não interessa se a "Súplica cearense" é cantada na sanfona de Luiz Gonzaga ou no sample d'O Rappa, o que interessa é a humildade da fala do sertanejo cearense se desculpando por ter errado na oração. Não interessa se a "Aquarela do Brasil" é cantada na voz de Ary Barroso ou na de Gal Costa, o que interessa é o Brasil ser mostrado de forma magnífica na letra. Só não vale é a letra ser esdrúxula, repetitiva, de fácil memorização, mas péssima audibilidade, como são muitas das músicas feitas hoje em dia. Enfim, para mim, não interessa se a música boa tenha forma, o que me interessa é o seu conteúdo, o que interessa é o que o compositor tem pra dizer...

Súplica cearense


Oh! Deus, perdoe esse pobre coitado 
Que de joelhos rezou um bocado 
Pedindo pra chuva cair, cair sem parar 

Oh! Deus será que o senhor se zangou 
E é só por isso que o sol se arretirou 
Fazendo cair toda chuva que há 

Oh! Senhor, pedi pro sol se esconder um pouquinho 
Pedi pra chover, mas chover de mansinho 
Pra ver se nascia uma planta, uma planta no chão 

Oh! Meu Deus, se eu não rezei direito 
A culpa é do sujeito 
Desse pobre que nem sabe fazer a oração 

Meu Deus, perdoe encher meus olhos d'água 
E ter-lhe pedido cheio de mágoa 
Pro sol inclemente, se arretirar, retirar 

Desculpe, pedir a toda hora 
Pra chegar o inverno e agora 
O inferno queima o meu humilde Ceará 

Oh! Senhor, pedi pro sol se esconder um pouquinho 
Pedi pra chover, mas chover de mansinho 
Pra ver se nascia uma planta no chão, planta no chão

(Gordurinha / Nelinho)

E num é que o forró se encaixou direitinho no reggae. Ótima essa versão que O Rappa fez da música "Súplica cearense" que já tinha sido imortalizada nas vozes de Luiz Gonzaga e Fagner. Que pena que mais uma vez a água acaba com a esperança do nosso humilde povo do Siará. O povo luta e luta contra a seca, mas de repente vem a chuva e leva tudo embora. E a culpa disso tudo é de quem? De Deus ou do próprio homem? "Ganância demais. Política demais. Descaso demais. Tristeza demais. Pobreza demais. Miséria demais. Interesse tem demais"...

Analogisando psicanaliticamente o futebol...

"E quando analisamos psicanaliticamente o futebol, por exemplo, nós encontramos uma explicação multimilenar para a força que o futebol traz dentro de si. Outrora, milênios e milênios, quando os inimigos se defrontavam em guerras sem quartel, os vencidos eram degolados e suas cabeças rolavam ao chão e os vencedores as chutavam, fazendo com que rolassem como se fosse uma bola. Isso traduzia a força mística de uma das religiões mais antigas que é o bramanismo, segundo a qual, os homens teriam sido criados em quatro castas: os sacerdotes proveriam da cabeça de Brama; os guerreiros, do peito de Brama; os comerciantes e artesãos proveriam do abdômen de Brama e, finalmente, os parias proviriam dos pés de Brama. E nestes combates, com a parte mais vil de seu corpo (os pés), os vencedores chutavam a parte mais nobre de seus inimigos (a cabeça), demonstrando exatamente o desprezo que por eles manifestavam, fazendo rolar com chutes sucessivos a cabeça dos vencidos..."

Palestra ministrada pelo professor Inezil Penna Marinho no VI Encontro Nacional de Professores de Educação Física, realizado na cidade de Tramandaí, Rio Grande do Sul, em abril de 1980.
Extraído do livro "Inezil Penna Marinho: coletânea de textos" (2005), organizado por Silvana Vilodre Goellner.

Mas que analogia mais impressionante...

terça-feira, 19 de maio de 2009

Paradoxos...

Eu sou preciso nos meus movimentos, mas qualquer um faz qualquer coisa melhor que eu. Eu só preciso dos meus movimentos, por isso ninguém faz nada para mim. Eu suo com os meus movimentos, mas nada soa bem aos ouvidos. De tudo que eu quero, nada jamais será feito. De nada do que eu deveria querer, tudo já está realizado. Não gosto de falar, por isso escrevo. Não gosto de fazer, por isso penso. Se nada faz sentido, eu lhe dou todos. Se todos são iguais, não sou assim. Se é pra frente que se anda, então eu volto atrás. Para um lado e para o outro, sem direção. Pra se fazer o que é certo, disposição. Pra discordar de tudo isso, contradição...

sexta-feira, 8 de maio de 2009

A hora mais apropriada

Na escuridão da noite
Ou no clarão da madrugada?
Qual é a hora mais apropriada
Para brincar de ser adulto?

Se a noite é uma criança,
Brincando a gente faz uma.
Na madrugada não pára,
Nesse jogo ninguém separa.

São dois nessa partida,
Somente um contra o outro.
Na posição preferida,
Se faz tudo e mais um pouco.

É hora do músculo enrijecer,
Num êxtase puro de prazer.
O falo pronto para fazer,
O que o outro órgão querer.

No meu falo você cala,
No teu colo eu descanso.
Depois volta o exercício
E dessa vez eu sou mais manso.

As palavras são os estímulos,
Por isso não me calo.
Peço tudo o que quiser,
Fantasias então eu falo.

Agora mudou a posição,
Mas continua a atração.
No pé do ouvido ela vai pedindo
E para fazer eu vou sorrindo.

A noite chegando ao fim,
A madrugada aparecendo.
Se deixarem tudo assim,
Até amanhecer se vai gemendo.

Gozou, gozei, gozamos,
Mais suados nós ficamos.
Ela diz: "Eu quero mais."
Eu respondo: "Está bem, a gente faz."

No final tudo feliz,
Foi feito tudo que se quis.
Dia, noite ou madrugada,
Qualquer hora é a mais apropriada.

(Janderson Felipe)

Passando a madrugada em claro fazendo coisas.
A poesia meu povo...

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Pro Poeta Safado

O sujeito é uma figura,
No sentido figurado.
Porque no sentido real,
Ele é um poeta safado.

Safado para expor qualquer negócio,
Do sexo ao amor, do trabalho ao ócio.
Tudo junto, nada separado.
Para ele qualquer assunto é adequado.

Literária é sua mente,
Totalmente marginal.
Livre de qualquer regra ou lei
Que desajusta o intelectual.

Literalmente poeta,
Creia, cria e recria.
Porque com uma mente dessa meu caro,
Qualquer assunto ou conversa vicia.

(Janderson Felipe)

Prum poeta amigo meu, Safado no nome, gênio nas palavras...

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Cante lá que eu canto cá

Poeta, cantô de rua,
Que na cidade nasceu,
Cante a cidade que é sua,
Que eu canto o sertão que é meu.

Se aí você teve estudo,
Aqui, Deus me ensinou tudo,
Sem de livro precisá
Por favô, não mêxa aqui,
Que eu também não mexo aí,
Cante lá, que eu canto cá.

Você teve inducação,
Aprendeu munta ciença,
Mas das coisa do sertão
Não tem boa esperiença.
Nunca fez uma paioça,
Nunca trabaiou na roça,
Não pode conhecê bem,
Pois nesta penosa vida,
Só quem provou da comida
Sabe o gosto que ela tem.

Pra gente cantá o sertão,
Precisa nele morá,
Tê armoço de fejão
E a janta de mucunzá,
Vivê pobre, sem dinhêro,
Socado dentro do mato,
De apragata currelepe,
Pisando inriba do estrepe,
Brocando a unha-de-gato.

Você é muito ditoso,
Sabe lê, sabe escrevê,
Pois vá cantando o seu gozo,
Que eu canto meu padecê.
Inquanto a felicidade
Você canta na cidade,
Cá no sertão eu infrento
A fome, a dô e a misera.
Pra sê poeta divera,
Precisa tê sofrimento.

Sua rima, inda que seja
Bordada de prata e de ôro,
Para a gente sertaneja
É perdido este tesôro.
Com o seu verso bem feito,
Não canta o sertão dereito,
Porque você não conhece
Nossa vida aperreada.
E a dô só é bem cantada,
Cantada por quem padece.

Só canta o sertão dereito,
Com tudo quanto ele tem,
Quem sempre correu estreito,
Sem proteção de ninguém,
Coberto de precisão
Suportando a privação
Com paciença de Jó,
Puxando o cabo da inxada,
Na quebrada e na chapada,
Moiadinho de suó.

Amigo, não tenha quêxa,
Veja que eu tenho razão
Em lhe dizê que não mêxa
Nas coisa do meu sertão.
Pois, se não sabe o colega
De quá manêra se pega
Num ferro pra trabaiá,
Por favô, não mêxa aqui,
Que eu também não mêxo aí,
Cante lá que eu canto cá.

Repare que a minha vida
É deferente da sua.
A sua rima pulida
Nasceu no salão da rua.
Já eu sou bem deferente,
Meu verso é como a simente
Que nasce inriba do chão;
Não tenho estudo nem arte,
A minha rima faz parte
Das obra da criação.

Mas porém, eu não invejo
O grande tesôro seu,
Os livro do seu colejo,
Onde você aprendeu.
Pra gente aqui sê poeta
E fazê rima compreta,
Não precisa professô;
Basta vê no mês de maio,
Um poema em cada gaio
E um verso em cada fulô.

Seu verso é uma mistura,
É um tá sarapaté,
Que quem tem pôca leitura
Lê, mais não sabe o que é.
Tem tanta coisa incantada,
Tanta deusa, tanta fada,
Tanto mistéro e condão
E ôtros negoço impossive.
Eu canto as coisa visive
Do meu querido sertão.

Canto as fulô e os abróio
Com todas coisa daqui:
Pra toda parte que eu óio
Vejo um verso se bulí.
Se as vêz andando no vale
Atrás de curá meus male
Quero repará pra serra
Assim que eu óio pra cima,
Vejo um diluve de rima
Caindo inriba da terra.

Mas tudo é rima rastêra
De fruita de jatobá,
De fôia de gamelêra
E fulô de trapiá,
De canto de passarinho
E da poêra do caminho,
Quando a ventania vem,
Pois você já tá ciente:
Nossa vida é deferente
E nosso verso também.

Repare que deferença
Iziste na vida nossa:
Inquanto eu tô na sentença,
Trabaiando em minha roça,
Você lá no seu descanso,
Fuma o seu cigarro mando,
Bem perfumado e sadio;
Já eu, aqui tive a sorte
De fumá cigarro forte
Feito de paia de mio.

Você, vaidoso e facêro,
Toda vez que qué fumá,
Tira do bôrso um isquêro
Do mais bonito metá.
Eu que não posso com isso,
Puxo por meu artifiço
Arranjado por aqui,
Feito de chifre de gado,
Cheio de argodão queimado,
Boa pedra e bom fuzí.

Sua vida é divirtida
E a minha é grande pená.
Só numa parte de vida
Nóis dois samo bem iguá:
É no dereito sagrado,
Por Jesus abençoado
Pra consolá nosso pranto,
Conheço e não me confundo
Da coisa mió do mundo
Nóis goza do mesmo tanto.

Eu não posso lhe invejá
Nem você invejá eu,
O que Deus lhe deu por lá,
Aqui Deus também me deu.
Pois minha boa muié,
Me estima com munta fé,
Me abraça, beja e qué bem
E ninguém pode negá
Que das coisa naturá
Tem ela o que a sua tem.

Aqui findo esta verdade
Toda cheia de razão:
Fique na sua cidade
Que eu fico no meu sertão.
Já lhe mostrei um ispeio,
Já lhe dei grande conseio
Que você deve tomá.
Por favô, não mexa aqui,
Que eu também não mêxo aí,
Cante lá que eu canto cá.

(Patativa do Assaré)